Voto eletrônico

O relatório das Forças Armadas sobre o processo eleitoral mostra o seguinte: não há como afastar a hipótese de fraude, seja porque é possível a inserção de um código malicioso, seja porque o TSE não ofereceu toda a base de dados para fiscalização.

Mais estarrecedor ainda, os técnicos do Exército vislumbraram, no código-fonte de votação, acessos a servidores externos. Perguntaram ao TSE a respeito do fato, mas não obtiveram resposta. Tal fato, por si só, pode anular as eleições (art. 221, II do Código Eleitoral).

Esse relatório ainda me faz lembrar de outra coisa: o STF julgou inconstitucional a lei do voto impresso, utilizando-se de um entendimento esdrúxulo. Fazem de tudo para evitar a auditoria do sistema. E ainda se dizem defensores da democracia.

O Tribunal Constitucional Alemão, por sua vez, julgou inconstitucional o voto eletrônico. O motivo: 

A eleição como fato público é o pressuposto básico para uma formação democrática e política. Ela assegura um processo eleitoral regular e compreensível, criando, com isso, um pré-requisito essencial para a confiança fundamentada do cidadão no procedimento correto do pleito. A forma estatal da democracia parlamentar, na qual o domínio do povo é midiatizado através de eleições, ou seja, não exercido de forma constante nem imediata, exige que haja um controle público especial no ato de transferência da responsabilidade do Estado aos parlamentares (Voto do juiz Andreas Vosskuhle ao anunciar a decisão do tribunal).

Para a corte máxima alemã, um "evento público" como uma eleição implica que qualquer cidadão possa dispor de meios para averiguar a contagem de votos, bem como a regularidade do decorrer do pleito, sem possuir, para isso, conhecimentos especiais.

Portanto, é pressuposto do processo eleitoral democrático a sua fiscalização por parte do povo. O voto eletrônico, por sua vez, somente pode ser auditado por técnicos, o que exclui a participação popular. Por conseguinte, em Pindorama, não é praticada a democracia. Nós temos outro regime, autocrático, visto que não há transparência no processo eleitoral e as instâncias de fiscalização, além de precárias, não podem ser exercidas pelo povo diretamente.

Concluo com a lição de Norberto Bobbio, ao dissertar sobre a necessária junção entre democracia e transparência:

Qualquer forma de poder oculto, ao tornar vão esse direito, destrói um dos pilares em que se apoia o governo democrático. De resto, quem promove formas de poder oculto, e quem a elas adere, deseja precisamente isto: excluir suas próprias ações do controle democrático, não se submeter aos vínculos que toda constituição democrática impõe a quem detém o poder de tomar decisões que vinculem a todos os cidadãos. Pretende, eventualmente, controlar o Estado sem por ele ser controlado. No Estado despótico, o soberano vê sem ser visto. O ideal de toda forma de poder oculto é que o soberano, neste caso o governo democrático, que age à luz do sol, possa ser visto sem poder ver (BOBBIO, Norberto. Democracia e Segredo. São Paulo: Unesp, 2015, p. 41).

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