Ourocu



Meu caro amigo, Felipe. Como está você? Estou preocupado, cara.

Lamento te procurar nestas circunstâncias, mas só fiquei sabendo agora. Contaram-me tudo ontem à noite.

Disseram que você participa de uma “sociedade secreta” de travestis. Fiquei abalado. Isso existe mesmo?

Eu acreditava que você era mente aberta, mas não sabia que era tanto assim.

Falaram de um dos encontros que essa “sociedade” promove, lá em Ouro Preto. No porão de um antigo comércio. Em que escravos já viveram.

Mencionaram o nome "Ourocu”. Poucos sabem de sua existência, mas depois desse episódio, fica difícil esconder o que vocês fazem.

Eis os detalhes.

Tudo rola em um antigo casarão histórico, nas cercanias da cidade. A entrada é restrita. Você não pode entrar sem a senha que é fornecida, na véspera, para os convidados.

Logo na antessala, são oferecidas drogas e instrumentos voltados ao sexo.

Descendo as estreitas escadas de madeira, chega-se ao inferno, pelo que dizem.

Em meio a uma atmosfera esfumaçada e lúgubre, anões nus atiçam os que acabam de chegar, açoitando-os com varas.

Nas paredes, presas aos antigos grilhões dos escravos, várias pessoas devem aguardar a sua vez de ser chicoteadas, ou pelos anões, ou pelos travestis, os quais soltam gargalhadas bestiais e baforadas de cigarro enquanto perambulam pelo recinto.

Em um canto, relatam que existe uma jaula, iluminada por tochas, onde heterossexuais são encerrados e ridicularizados pelos travestis, que ejaculam em quem está preso.

O recinto é tomado de luzes que vão e vem, enquanto os participantes ora urram de dor, ora soltam gritos de prazer. O falatório grosso dos transsexuais e a música alta ditam o ritmo.

Mas, de toda aquela loucura, falam de uma cena ignóbil que ocorre no centro do salão: uma enorme banheira, preenchida com um líquido vermelho que emula sangue; acima dela, vários cabos suspensos com indivíduos presos por ganchos pelas costas. Em determinado momento, um travesti solta um dos cabos, e a pessoa suspensa cai na banheira, encharcando o recinto com o líquido vermelho, em meio aos berros delirantes dos promotores daquele ritual macabro.

Meu camarada, se isso tudo for verdade e se você estiver participando, creio que esta será a minha última comunicação contigo.

Não quero me relacionar com uma pessoa que se sujeita a isso. Ok?

Você é livre para fazer o que quiser, mas tudo tem um limite.



Forte abraço.

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