O debate público e a imprensa

 Por Rodrigo da Silva



Nós definitivamente experimentamos no Brasil uma crise no noticiário.

Segundo o Reuters Institute, em 2015, 62% dos brasileiros confiavam na imprensa. Em 2023, esse número despencou para 43%.

É uma queda muito rápida em muito pouco tempo.

A Globo (TV Globo, GloboNews, G1) é a empresa de jornalismo com o maior índice de falta de confiança (31%). Quase um em cada três brasileiros não confia no trabalho do grupo.

A mesma pesquisa diz que 41% dos brasileiros evitam o consumo de notícias e de conteúdo jornalístico – um número acima da média mundial, de 36%.

Há um evidente aumento da falta de confiança do país com o trabalho da imprensa. E se dá para dizer que isso acontece, em parte, pelo aumento da polarização e da resistência que massas partidárias têm em encarar notícias que desagradam as suas visões ideológicas – e que há inúmeros jornalistas fundamentais para a saúde do debate público brasileiro – também dá pra sustentar que:

1) Parte dos nossos veículos não sabe ser transparente em relação às suas linhas editoriais, tentando esconder do público o fato que parte de seus repórteres, apresentadores e analistas possuem flagrantes predileções ideológicas, facilmente percebidas pela audiência; 2) Muitos dos nossos jornalistas se comportam como se monopolizassem a verdade e tivessem o direito de exigir credibilidade do público, adotando um tom professoral e autocentrado que apenas gera hostilidade da opinião pública; 3) Muitos dos nossos jornalistas se comportam como assessores de imprensa, dando às fontes – especialmente do universo político – um papel de protagonismo que se sobressai à própria apuração jornalística, como se, sozinho, um entrevistado, em off, garantisse a veracidade de uma notícia; e 4) Muitos dos nossos colunistas produzem conteúdos de péssima qualidade, contratados em nome de uma pretensa diversidade de opinião que, mal conduzida, atinge frontalmente a credibilidade da imprensa profissional.

Tudo isso contribui para gerar antipatia e desconfiança.

E quando há descrédito com os profissionais que são pagos para apurar notícias, e um incremento das técnicas e do alcance da propaganda política nas redes sociais, há proliferação de notícias falsas. E não dá pra jogar pra debaixo do tapete esse problema.

Uma sociedade bem informada tem mais recursos disponíveis para tomar melhores decisões, tanto nas urnas quanto na vida cotidiana. Essa é a razão por que 1) o trabalho da imprensa é tão importante, 2) as fake news são tão prejudiciais.

A industrialização do boato é um câncer que corrói o debate público. E os partidos e movimentos políticos têm grande responsabilidade sobre isso.

Só que não dá pra negar que nós também vivemos uma crise no combate a essa indústria.

Segundo uma pesquisa do PoderData, o STF – o principal encarregado em combater notícias falsas no país – terminou 2023 avaliado positivamente por apenas 19% dos brasileiros. Mesmo entre os petistas, a avaliação positiva está em 25%.

Em todas as pesquisas de opinião, menos de 1/3 do país aprova o Supremo Tribunal Federal.

As nossas instituições parecem convencidas de que só uma parcela do debate público é capaz de produzir notícias falsas. Mas ela conseguiu ir além disso: criou um ambiente generalizado de autocensura.

Se é positivo combater calúnia, difamação e desinformação, é extremamente prejudicial estabelecer um ambiente onde o crime de pensamento é justificado em nome de uma falsa proteção à democracia. E as nossas instituições parecem dedicadas a jogar o bebê fora junto com a água do banho.

É a tempestade perfeita.

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